sábado, 14 de janeiro de 2017

FOTOSINTESE





Sem dar por mim,
Dei-me conta de estar sozinho
Não eu, nem a minha imagem
Mas uma fotografia
Sem retoques nem margens.
Não sei onde, nem quando
Sei que me senti agarrado
A cinzas escorrendo das mãos
Num abrir e fechar de braços
Que deixavam um rasto de asas.
Asas de pó e cinza,
Ora cinzentas ora amarelas
Translúcidas como o purgatório.
Acho que era um pouco disso,
Até porque a imagem é irreal
Cheia de sonhos transformados
Filtrados de pesadelos idos.
Tudo se filtra afinal, até os sonhos
Porque é a partir deles
Destes meus sonhos,
Que vivo a minha realidade.
Sou criança, desde sempre
Desde que cresci. Não antes.
Sou o impulso da realidade
Com o sonho como raiz
Que rego com as lágrimas
Já secas agora, mas guardadas.
Em sonho, posso guardar as lágrimas
Numa redoma cheia de Sol
Onde o deserto não é árido.
É apenas seco, até chegar a madrugada
Até que as gotas de orvalho
Larguem as folhas satisfeitas
De uma seiva persistente
E caiam devagar, lentamente
Dividindo-se em proporções
Equivalentes às lágrimas secas.
E nasce a vida. Renasce a vida,
Onde parou antes, guardada
Com abanos de cabeça
No canto do quarto quase escuro
Sem encontrar a porta de fuga.
Não há choro nem gritos
Não há pânico nem ansiedade
Não há nada!
Há um agora, orvalhado
Resumido a raízes que brotam
De um peito hirto de amor
Que supera toda a violência.
Sou como uma árvore
Que cresce devagar
Sem dar nas vistas,
Rompendo e enrijando
Todos os membros.
O coração é o primeiro
Que enrijece e se cala
Porque aprende tudo
E finge tudo,
Golfando o brado da vida
Por todas as veias
Onde a minha seiva brota.
É a minha fotosintese
Brutal e animalesca
Que corre numa pista de veludo
À procura do Sol.
Já não me escondo
Já não tenho paredes à volta
Nem cantos de medo.
Sou a seiva pura
Que se me mistura
Para ser Eu.




14JANEIRO2017



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